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27.11.07

Espiral lenta

No inicio é fácil. As perspectivas são boas, queres fazer algo que deixe uma marca, algo que te defina neste mundo. Corres, tentas, cais, falas, corres e voltas a tentar. Imaginas um futuro grandioso, ideias loucas e geniais, imaginas que fazes a diferença.
Depois, os dias amanhecem frios. O céu fica mais escuro, o nevoiro instala-se. E tu tentas de novo. Mas as ideias já não brilham.
Quando dás conta, já não és tu que olhas pela janela e imaginas um campo de flores, opções coloridas e aliciantes. É outro que olha. É outra pessa que a abre. É alguem que colhe as flores. Mas não és tu.
Olhas para trás e lamentas. Choras por ti. Choras por quem serias. E mergulhas na escuridão.

22.8.07

Hoje é um daqueles dias.
É um daqueles dias que preferia não me ter levantado da cama. Não queria ir trabalhar. Apetecia-me dizer mal da minha vida, lamentar-me ininterruptamente.
É um daqueles dias que o meu cabelo ficou horroroso, a minha pele parece a pele de uma adolescente estúpida, apesar de eu sentir que, neste dia, tenho mais dez anos em cima. É uma daqueles dias em que sou confrontada com todas as minhas fraquezas. Em que me sinto imensamente gorda. Em que quero acabar um trabalho e parece que a minha capacidade mental fugiu para a cochinchina. É um daqueles dias em que o mar é uma barreira demasiado grande para ignorar. Estou mais longe de tudo. Estou mais longe de todos. Estou numa ilha. Estou “na minha ilha”, para onde não há aviões diários ou barcos, ou Internet ou telefone. É um daqueles dias em que eu não sou eu. Mesmo procurando no fundo de mim, teimo em não aparecer.
Hoje é um daqueles dias que não devia ser um dia da minha vida.

14.7.07

Longe de uma consciência tranquila
Dentro de um mundo frio e cruel
Sem um pingo de amor ou de vida
Bebe-se um amargo travo a fel
Tudo é vermelho e brilha
Ondula, parando só para destruir
A verdade numa pele fria
E o odor fresco do teu sorrir
Não há água, só um rio de lava...
No inferno só se grita de raiva, incontida;
As lágrimas são o castigo de quem paga
Por algo mais que uma triste vida...
Eu nada quero, senão ter-te
Não quero o céu, o inferno ou a morte
Na vida, ou com ela, ver-te
É mais do que espero, é mais do que sorte.
O destino é implacável e uniu-nos.
Bate a chuva quente na minha alma
E o sol espreita na minha inconsciência
Tudo luz no fundo da água calma
Nas profundezas de uma suave inocência
Ouço as palavras cair no papel
E o sorriso, apaga as suas cores frias
De dor, amargas, sabor a fel
Lavam-se de mim, não são minhas.
Deixo a dor ir na corrente,
Aqui, entre o céu e a terra...
O rio é mudo, mas inconstante,
Liberta a mágoa que o corpo encerra.
Mas a vida continua...
Não congela nestes vagos momentos.
O olhar perde-se para além da lua
Apaga-se a dor no esquecimento.

21.6.07

A velha

Naquela rua havia uma casa,
De amarelo e rosa incendiada,
Por onde o carteiro, todos os dias, passava,
E para a janela sorria...

Da janela uma velha espreitava,
Tão velha quanto a casa era!,
Quando o carteiro passava,
Ela nada dizia,
Mas nos seus olhos uma vida se lia...

20.6.07

E quando anoitece
E a noite arrefece
Procuro abrigo na curva
Dos teus lábios.

Procurar

Não procuro mais porque não sei como,
mas sei sonhar que procurar é fácil,
decidir que saber se esconde nas memórias...

Quero mais mas não sei quando,
sinto demais sem esquecer como,
quando queria lembrar mais do que lembro.

Desvanece-se o sonho,
e doi não saber mais,
mas lembrar o que procuro...
Continua.

1.6.07

Quando basta o amor?


O tempo que nos cabe (ainda)

É dentro da cabeça,
lá dentro,
que o tempo nos consome
e nos faz falta.
Não há chuva morna
nem sol
que nos aqueça, quando
nos falta o sopro,
a luz, a cega fé que nos mantém
despertos, quando
por fora, o corpo
já anuncia a noite
mais profunda.
Por isso,
é dentro da cabeça,
cá dentro,
para lá dos céus,
antes que o mar termine,
nesta imensa confusão
de meridianos
que nos dói e nos deslumbra,
que se aloja o segredo
indecifrável:
a cor, o som, a luz
que nos conforta,
neste intensamente breve
instante
que é o tempo que nos cabe

António Mega Ferreira

Maria Turbina


31.5.07

Nós temos cinco sentidos: são dois pares e meio de asas. - Como quereis o equilíbrio?

David Mourão-Ferreira

29.5.07

Envolto em sombras
O meu coração vagueia
Na rua da insensatez
Sem dor ou amor
Esquecimento ou rancor

Sem saber quem procura
Quando a noite se deita
Sem saber quem quer ser…